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terça-feira, 9 de julho de 2013

Uma outra Reforma Política

Por Antônio Augusto Mayer dos Santos

Não há mais possibilidade de contornar temas aflitivos que despertam indignação social. A sucessão de Comissões e adiamentos impulsiona uma sensação de que o desfecho pretendido jamais será alcançado. Se por um ângulo a constante exposição da matéria converteu a Reforma Política numa espécie de redenção ética de cunho salvacionista, a outro é leviano supor que a sua aprovação funcionará, por si só, como um antídoto capaz de eliminar todas as mazelas políticas que vicejam no país.

É essencial que prevaleça lucidez na delimitação de temas que possam dar vitalidade à política como atividade pública respeitável. Lista fechada, voto distrital e financiamento público são temas importantes mas demasiadamente complexos para este momento-limite, onde a população rejeita o formato vigente. Outras questões mais factíveis e nem por isso menos decisivas, todas amparadas em projetos formulados e tramitando, se credenciam como viáveis para atenuar os níveis de saturação que o sistema eleitoral e de representação manifestam.

Ampliação das atribuições de deputados estaduais e vereadores – A administração pública, de qualquer grau, é sempre compartilhada. Não é razoável que iniciativas parlamentares sejam restringidas sob a alegação de interferência no Executivo. Projetos relevantes não podem ser repelidos por sua origem parlamentar. Parlamentos são polpas vivas das comunidades e merecem real autonomia, sobretudo porque seus integrantes são tão eleitos quanto os Chefes do Poder Executivo.

Eliminação do quociente eleitoral – A representação popular sofre desvirtuamento quando um candidato ao Legislativo, amparado em votação retumbante, é preterido por outro de desempenho inferior. Conforme a PEC 54/07, os eleitores, além de não entenderem, desconfiam de um sistema eleitoral que admite a eleição de candidatos com pouca votação. A eleição dos mais votados corresponde à verdade eleitoral num país com mais de 30 siglas registradas na Justiça Eleitoral.

Suplentes no recesso – Porque contrasta à realidade e ao bom senso, a efetivação de substitutos remunerados nos períodos de recesso parlamentar é descartável vez que a sua finalidade se revela contraproducente. O parlamentar fica impossibilitado de apresentar projetos, participar de sessões e as Comissões não se reúnem. Esta anomalia desacredita o Parlamento perante o eleitor.

Candidaturas avulsas – A exemplo de diversos países (Estados Unidos, Itália, Israel, Portugal, Alemanha), admitir candidaturas de não-filiados subscritas por eleitores ou entidades civis ampliaria a participação política. As candidaturas independentes já foram possíveis até meados da década de 40 no Brasil.

Redução da Câmara dos Deputados – Inoperância pelo excesso de parlamentares, elevado custo público, sucessões de escândalos, apresentação de projetos inúteis ou bizarros, produção legislativa escassa ou irrelevante. É a indisfarçável ineficiência de uma estrutura acrítica justificando a sua diminuição.

Extinção dos suplentes de senador – Preenchida de forma indireta e confinada à homologação de nomes indicados pelos partidos, a suplência, além de impopular, é destituída de respaldo pelo eleitor e vulnera a soberania popular que chancela as eleições para os demais cargos.

Redução de mandato dos senadores – A demasiada extensão do mandato senatorial, a par de anacrônica, é fator impeditivo à renovação e fiscalização da Casa Legislativa e de seus membros. O cargo de Senador é relevante por suas atribuições e não pela sua duração. Oito anos é tempo demasiadamente extenso. Sua redução para quatro seria adequada, inclusive porque todos os demais mandatos são por este período.

“Janela” partidária – Uma troca de partido no curso do mandato não pode ser vedada de forma artificial e tampouco rotulada de injustificável. É imperativo atenuar o rigorismo vigente, imposto artificialmente pelo TSE através de uma medida administrativa ao invés de uma lei votada pelo Parlamento. Nas agremiações muitas vezes ocorrem fatos que tornam a coexistência insuportável. O mandatário, desde que justificadamente, tem o direito de exercer a sua representação em partido diverso daquele pelo qual se elegeu.

Para a efetivação destas melhorias, plebiscito, referendo e constituinte são procedimentos demagógicos, desnecessários, onerosos e inúteis. A Reforma Política é um empreendimento da cidadania que depende exclusivamente do Congresso Nacional restaurar a sua missão precípua e indelegável: legislar de acordo com a Constituição vigente.

Antônio Augusto Mayer dos Santos é advogado especialista em direito eleitoral, professor e autor dos livros “Prefeitos de Porto Alegre – Cotidiano e Administração da Capital Gaúcha entre 1889 e 2012” (Editora Verbo Jurídico), “Vereança e Câmaras Municipais – questões legais e constitucionais” (Editora Verbo Jurídico) e “Reforma Política – inércia e controvérsias” (Editora Age). Escreve no Blog do Mílton Jung.

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Equívocos do voto em lista


Por Antônio Augusto Mayer dos Santos
Em países onde há um número menor de partidos e há expressa limitação ao exercício de mandatos sucessivos, o Voto em Lista é uma forma racional de preenchimento das vagas nos parlamentos, sobretudo onde o índice de corrupção eleitoral é excepcionalmente menor. No Brasil, onde os Tribunais Eleitorais cassam mandatos às dezenas e existem 27 partidos (ou siglas) habilitados às disputas, não há menor condição para esta realidade.
O país não pode absorver de forma acrítica e meramente idealizada um sistema de escolha inspirado em países onde os partidos políticos ostentam histórias de 70 anos ou mais. Outras circunstâncias evidenciam o equívoco da sua introdução num país onde os dirigentes partidários não tem o hábito de estimular renovações em cúpulas nacionais.
A primeira, amparada em rumorosos episódios de corrupção parlamentar (“Mensalão”, “Sanguessugas”, etc), de que há o risco das listas serem desviadas de sua finalidade precípua para, na penumbra dos oportunismos partidários, viabilizar abrigo a filiados punidos buscando imunidade parlamentar ou expulsos de agremiações, dentre outras hipóteses.
A segunda, que pelo fato da redação do caput do art. 14 da Constituição Federal dispor que “A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos”, a lista, seja o formato que tiver, poderá sofrer questionamento judicial, leia-se Supremo Tribunal Federal, sob o poderoso argumento de que a seleção de nomes foi referendada diretamente pela esfera partidária mas indiretamente pelo eleitor. Ora, o eleitor é o destinatário da representação popular.
Este é um elemento substancial porque a Carta Republicana não prevê critérios intermediários para determinar a representação popular. Neste sentido, pode-se inclusive dizer que os filiados passarão a gozar de um status de “mais cidadãos” que os demais eleitores, o que equivale estabelecer uma hierarquia neste setor. Quanto mais não fosse, o Congresso Nacional não está analisando sequer o item dos quocientes (partidário e eleitoral). Logo, há uma notável contradição em propor o gênero sem alterar a espécie.
Terceira, que não haverá nenhum impedimento legal para que partidos cujas nominatas não aglutinem densidade suficiente lancem – sabe-se lá sob que critério – no topo da lista alguma personalidade para captar os sufrágios necessários e, com isso, eleger uma nominata de coadjuvantes sem expressão política.
Por fim, a elaboração das listas preordenadas remeterá às Comissões Executivas e Convenções Partidárias um conjunto de atribuições e responsabilidades sem precedente na história da legislação eleitoral, o que escancara a complexidade de um instituto jurídico desta dimensão. Com isto, sem o estabelecimento de critérios legais diretos para reprimir falcatruas ou fraudes partidárias, o processo fica imperfeito e pior que o vigente. Afinal, o voto de cada convencional ou filiado passa a ser estratégico para uma (boa) colocação na lista. E os projetos legislativos que tramitam se omitiram deste “detalhe”.
O eleitor brasileiro merece ter preservado o seu amplo direito de escolha nominal dos candidatos às assembléias políticas sob pena de se determinar o renascimento de oligarquias partidárias ao estilo daquelas que infelicitaram a República Velha e levaram este País a uma revolução, em 1930. Por conta de tudo isso, é possível conjecturar que o sistema de lista fechada poderá se erigir num poderoso obstáculo à renovação dos quadros partidários, tornando as cúpulas imbatíveis. Como bem sintetizou o jornalista Igor Paulin em matéria da revista Veja (nº 2217, 18.05.2011, pp. 75), “Na geléia geral dos partidos brasileiros, em que há gente que que admite não ser “nem de direita, nem de esquerda, nem de centro”, não há menor justificativa para isso”.
Em suma: este não é um modelo sensato para um país como o Brasil.
Antônio Augusto Mayer dos Santos é advogado especialista em direito eleitoral, professor e autor do livro “Reforma Política – inércia e controvérsias” (Editora Age). Às segundas, escreve no Blog do Mílton Jung.

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